O escapulário do Carmo: sinal da vocação batismal

As roupas fazem parte de nosso cotidiano. Conforme as circunstâncias, escolhemos vestir uma ou outra peça de nosso guarda roupa. Dificilmente um homem usará terno e gravata para aparar a grama do jardim no fim de semana ou uma mulher vestirá uma peça de roupa do dia-a-dia desgastada e manchada para ir a uma festa casamento.  As roupas, além disso, também revelam parte daquilo que somos, de nossa identidade. A primeira impressão que as pessoas têm uma das outras se dá por aquilo que é exterior. Claro que ainda é um sinal externo, mas aponta, ou deveria apontar, algo daquilo que está no interior da pessoa. Na tradição da Igreja, por exemplo, no batismo, uma peça de roupa branca colocada sobre o catecúmeno serve para recordar que agora ele pertence ao número dos convocados à santidade, na pátria celeste (cf. Ap. 7,9). O escapulário de Nossa Senhora do Carmo também é uma peça de roupa. Certamente é diferente de uma peça encontrada na “Riachuelo”, “Pernambucanas” ou “C&A”, todavia nos faz bem recordar que é uma roupa que revela algo daquilo que somos, de nossa identidade.

O escapulário de Nossa Senhora do Carmo é uma das principais formas de devoção mariana da Igreja Católica. Essa devoção está diretamente ligada à Ordem Carmelitana. Nossa família religiosa surgiu no final do século XII, durante o tempo das cruzadas. Eremitas, vindos principalmente da Europa, se reuniram no Monte Carmelo, na Palestina, junto à fonte do profeta Elias, e estabeleceram morada. Depois de alguns anos, pediram ao patriarca de Jerusalém que lhes dessem uma regra de vida sob a qual todos deveriam continuar vivendo. Lá, construíram uma capela dedicada à Nossa Senhora, no centro de onde ficavam as celas, onde morava cada eremita. Principalmente por conta das invasões bárbaras à Terra Santa, eles retornaram, por volta 1238, à Europa.

Quando os carmelitas chegaram à Europa, tiveram muitas dificuldades para serem reconhecidos como uma Ordem religiosa. Corriam o risco de se extinguirem. Segundo alguns relatos, surgidos principalmente a partir do século XV, São Simão Stock, que seria o geral da Ordem, no ano de 1251 teria feito uma oração a Nossa Senhora pedindo sua proteção sobre os Carmelitas. Ele, segundo essas tradições, teve uma visão dela lhe entregando o escapulário e prometendo sua proteção à todos que estivessem usando o escapulário.

O escapulário é um longo pedaço de tecido marrom, com um buraco no qual passa a cabeça, da largura dos ombros, que cobre a parte da frente e das costas da pessoa, até os pés. Os religiosos o colocam sobre a túnica. Antigamente, ele era utilizado como um avental. Por questões de praticidade, difundiu-se entre os leigos, devotos de Nossa Senhora do Carmo, a prática de usar uma versão menor do escapulário, na qual geralmente carrega, além de um pedaço de tecido, as estampas de Nossa Senhora do Carmo, de um lado, e do Sagrado Coração de Jesus do outro. Essa devoção a partir de reflexões mais condizentes com nosso tempo, estar em íntima relação com o espírito cristão. Buscaremos, agora, oferecer uma reflexão contemporânea para o uso do escapulário a partir de três dimensões: pertença, consagração e serviço.

O escapulário, entendido como hábito, é sinal de consagração por meio da agregação à Família Carmelitana. Naquele tempo, no século XII, esse símbolo, mostrava tanto a pertença quanto a proteção por parte do dono daquele feudo ou fazenda. Assim, quem usava o escapulário de Nossa Senhora do Carmo pertencia ao grupo dos Irmãos da Bem-Aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo. Hoje, a Ordem reconhece que todos os que usam o escapulário são carmelitas. Por isso, é costume receber a imposição do escapulário de um ou uma carmelita, ou alguém devidamente autorizado. A pessoa é acolhida nesta família, e dela deve participar de acordo com seu carisma próprio. Somos chamados a ser uma presença orante, fraterna e profética no meio do povo. Desse modo, como cristãos que vivem um carisma específico, devemos viver como Maria, toda para Deus.

O escapulário é sinal de entrega total a Deus, de consagração. A espiritualidade carmelitana a chama de  “viver em obséquio de Jesus Cristo”. Para isso, nós devemos “estar dia e noite meditando na Lei do Senhor”. O escapulário toma nossa frente e nossas costas. Isso significa que cada um que usa o escapulário deve, assim como Maria, estar todo para Deus. Maria foi obediente e se ofereceu “todinha” a Deus (cf. Lc 1, 26). Nós também, como carmelitas, devemos fazer o mesmo. Essa entrega ao Pai, por sua vez, nos leva ao próximo.

Como já vimos, o escapulário é, antes de qualquer coisa, um avental. Usamos avental para o trabalho! Antigamente o usavam aqueles que estavam a serviço no campo, na horta, nos afazeres da casa. Nossa Senhora nos ensina que devemos estar sempre a serviço. Nas bodas de Canã, ela, mesmo sendo apenas convidada para a festa, estava na cozinha, atenta às condições de dificuldade das pessoas. O carmelita é convidado a estar na cozinha do mundo! Sabemos que o melhor caminho é estar atentos a fazer o que “Ele” nos disser, servindo ao Senhor, principalmente nos mais necessitados (cf. Jo 2, 1-12). Por isso, quem veste esse avental deve estar sempre em atitude de serviço (cf. Jo 13, 1-20).

O escapulário de Nossa Senhora do Carmo nos compromete a seguir os passos de Maria de Nazaré em atitude de obediência a Deus e no serviço a Cristo na busca de uma vivência fraterna entre os irmãos. Vestir o escapulário, portanto, não é um privilégio, mas um convite a missão. Vivendo em obséquio de Jesus Cristo e meditando dia e noite na Lei do Senhor, o carmelita segue, junto com Maria, os passos de Jesus de Nazaré. Ele nos convida a trabalhar, guiados pelo Espírito Santo, na construção do Reino de Deus. Confiantes na proteção de Nossa Senhora e com o coração todo voltado para Deus, nos colocamos com nossa irmã como discípulos-missionários na construção de um reino de Amor e Justiça. Esse caminho não é fácil! É por ele, porém, que nosso bentinho se aproxima da nossa missão assumida no Batismo e torna um sinal visível de uma devoção verdadeira e profética.